Comunicados

- 10/01/22

Controvérsias acerca do DIFAL do ICMS nas operações interestaduais com não contribuintes após a edição da Lei Complementar n. 190/22

O STF decidiu em fevereiro de 2021, em sede de repercussão geral (Tema 1093), que “a cobrança do diferencial de alíquota alusivo ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais”.

Na ausência desta lei complementar, portanto, é inválida a cobrança, em operação interestadual envolvendo mercadoria destinada a consumidor final não contribuinte, do diferencial de alíquota do ICMS (DIFAL), na forma do Convênio nº 93/2015 e das legislações internas dos Estados.

Os efeitos desta decisão, contudo, foram modulados, de forma que se aplicam apenas a partir do exercício de 2022. O DIFAL, portanto, pode ser cobrado até o final de 2021.

A expectativa era que a lei complementar fosse publicada ainda em 2021, especialmente para garantir sua eficácia já em 2022, mas acabou não sendo publicada a tempo.

Alguns Estados, de qualquer forma, se adiantaram e publicaram ainda em dezembro de 2021 suas respectivas legislações de regência interna, como foi o caso da Bahia, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Roraima, São Paulo, Sergipe e Tocantins.

No último dia 5.1.2022, na linha do que foi decidido pelo STF, foi publicada a Lei Complementar n. 190/22, veiculando as normas gerais da cobrança do DIFAL. Ato contínuo, no dia 6.1.2022, foi publicado o Convênio 236/21, dispondo sobre os procedimentos a serem observados nestas mesmas operações.

Diante deste cenário inúmeras questões surgiram, especialmente derivadas das divergências de interpretação da lei complementar e de suas disposições em comparação às legislações internas dos Estados. Abaixo, citamos algumas:

  1. Validade das legislações internas publicadas antes da Lei Complementar n. 190/22

Dúvida pertinente surge em relação à constitucionalidade das legislações dos Estados publicadas anteriormente à Lei Complementar n. 190/21.

Em situação semelhante (RE 1.221.330), o STF reconheceu a validade da legislação local editada em momento anterior à Lei Complementar, mas admitiu sua eficácia apenas após a vigência desta última.

Assim, seguindo esta linha, as leis editadas antes da Lei Complementar n. 190/22 são válidas, muito embora sua aplicação esteja condicionada à produção de efeitos desta norma geral e desde que não a contradigam.

  1. Base dupla x base única para cálculo do ICMS

Tanto a Lei Complementar n. 190/2022, quanto o Convênio ICMS 236/21, preveem a utilização de base única, correspondente ao valor da operação para fins de cálculo do ICMS devido para o Estado de origem e para o Estado de destino.

  1. Aplicação da anterioridade nonagesimal

A Lei Complementar, em seu artigo 3º, fez expressa referência ao artigo 150, III, “c” da Constituição Federal, o qual determina não ser possível cobrar tributos antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou.

É certo, portanto, que para além da discussão da anterioridade ser aplicável ou não à presente lei, o próprio legislador optou por dar a ela eficácia apenas após decorridos 90 dias de sua publicação. Até este prazo, não há bases legais para a cobrança do DIFAL.

Contudo, há Estados que possuem legislação interna sem previsão da aplicação da anterioridade nonagesimal (Bahia e Piauí), ou que já manifestaram entendimento diverso (Ceará e Rio Grande do Norte). Nestes casos há risco patente das mercadorias serem barradas nos Estados de destino mediante exigência de recolhimento do DIFAL.

Para estas situações recomenda-se avaliar medida judicial para garantir que ao menos os 90 dias para produção de efeito da Lei Complementar sejam respeitados.

  1. Aplicação da anterioridade anual

A questão ganha maior complexidade em relação à anterioridade anual, prevista na alínea “b” do inciso III do artigo 150 da Constituição Federal. Isso porque não estamos diante de instituição de novo tributo.

Em algumas situações pode haver majoração da carga a justificar a anualidade. Isso quando o Estado de origem e de destino possuem alíquotas internas diferentes, sendo a primeira inferior à segunda. Essa análise, contudo, precisa ser feita de forma individualizada por contribuinte e suas respectivas operações.

Por fim, é possível argumentar que a alínea “c”, citada pelo artigo 3º da Lei Complementar n. 190/22, faz referência à alínea “b”, o que significa que a anterioridade anual também seria aplicável. Mas o fato da própria lei complementar não ter mencionado a alínea “b” é argumento contrário possível, vez que demonstra que o legislador optou por não o incluir.

As soluções para evitar a bitributação e que mercadorias sejam barradas nos Estados de destino vão depender da situação individual e das peculiaridades das operações de cada contribuinte. Assim, é recomendado que as empresas obtenham assessoria adequada para enfrentar cada uma destas questões.